Tempos difíceis, mas não tão duros

“Tudo tem o seu tempo determinado,
e há tempo para todo o propósito debaixo do céu.
Há tempo de nascer, e tempo de morrer;
tempo de plantar, e tempo de arrancar o que se plantou;
Tempo de matar, e tempo de curar;
tempo de derrubar, e tempo de edificar;
Tempo de chorar, e tempo de rir;
tempo de prantear, e tempo de dançar;
Tempo de espalhar pedras, e tempo de ajuntar pedras;
tempo de abraçar, e tempo de afastar-se de abraçar;
Tempo de buscar, e tempo de perder;
tempo de guardar, e tempo de lançar fora;
Tempo de rasgar, e tempo de coser;
tempo de estar calado, e tempo de falar;
Tempo de amar, e tempo de odiar;
tempo de guerra, e tempo de paz.”
Eclesiastes 3:1-8

Doze dias… O que são 12 dias na vida de um adulto atarefado? Talvez pouco mais de uma semana ou quem sabe quase meio mês. O fato é que quando estamos inseridos em nossa rotina, 12 dias voam e, na maioria das vezes, não nos damos conta do que fizemos deles, apenas que passaram.

Meus últimos 12 dias foram atípicos. Na verdade não foram dias, foram horas. Duzentas e oitenta e oito para ser mais precisa, cadenciadas por um entra e sai de mulheres de branco que iam e viam, de dia e de noite, checar, medicar, conferir.

Filipe ficou esse tempo internado por conta de uma pneumonia (daí a ausência de novas postagens no blog) e o que começou como mais uma virose tornou-se uma questão mais séria. E a despeito de toda dureza que um ambiente hospitalar pode trazer para a vida de uma criança com procedimentos invasivos, confinamento, ambiente e pessoas estranhas, os últimos 12 dias nos trouxeram tantas coisas boas que seria injusto não pontuá-las.

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“Em todo o tempo ama o amigo e para a hora da angústia nasce o irmão.” Provérbios 17:17 Filipe e o amigo Teobaldo

A primeira delas foi a possibilidade de viver os tempos que marcam nossas vidas.

Nesses 12 dias experimentei o tempo de morrer para minha rotina e para o mundo que eu teimo em acreditar não rodar sem minha presença. Foi tempo de derrubar minha auto suficiência e reconhecer o quão dependente sou daqueles que me cercam. Tempo de me calar, tanto na voz quanto nas ideias. Tempo de guerra contra pensamentos ruins que insistiam em povoar minha mente.

20150503_072029Mas também foi o tempo de colher os frutos da relação sadia que estabeleci com Filipe desde seu nascimento. Tempo de rir, de dançar e de abraçar meu pequeno, como se nada estivesse acontecendo ao nosso redor. Tempo de buscar e coser uma conexão profunda com o fruto do meu ventre e de guardar cada expressão de confiança que ele depositava em mim.

Doze dias foi tempo suficiente para curar não apenas o corpo de Filipe, mas curar minha alma, minhas expectativas, minha maternidade.

Foi tempo de amar intensamente e ser amada em proporções ainda maiores.

E quando os doze dias findaram e nós finalmente chegamos em casa, vivi o tempo de chorar. Sim, um pranto profundo e doído, num tempo necessário para rasgar as emoções contidas, para lançar fora tudo o que havia sido retido e matar a tristeza que não havia se expressado até então. Tempo de afastar-me de Filipe que brincava feliz ao chegar em casa e me perder para encontrar paz.

Chorei muito, chorei pelo que vivi, pelo que vi meu filhote passar, chorei por ter voltado pra casa e por todas as mães que voltam sozinhas, sem a cria nos braços. Chorei de cansaço, de dor, de alívio. Chorei pelas inúmeras vezes que entraram no quarto e me chamaram de mãezinha quando dentro de mim crescia cada vez mais a consciência da minha força e da minha resistência. Chorei pelos pequenos que ouvi chorar e serem rechaçados pelos próprios pais. Por estarem doentes e comendo porcarias sob a tutela de uma instituição hospitalar, por passarem o dia inteiro ligados à TV e à noite gritarem de cansaço mental. Chorei por chorar e porque era bom me derramar em lágrimas.

O choro passou e o tempo de falar chegou. Tempo de edificar novamente nossas vidas, mas com o nascimento de outra relação familiar, mais profunda, mais conectada, mais verdadeira. E esse tempo é bom, muito bom!

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Sorriso de quem vê a rua novamente

Obrigada a todos que souberam da nossa situação e carinhosamente intercederam por nós!

16 comentários sobre “Tempos difíceis, mas não tão duros

  1. Ìvina, estou extremamente emocionada com o seu texto… Passei por isso, foram 5 dias, e já senti todo o peso da angústia de ver a minha pequena hospitalizada, invadida, me olhando com aqueles olhinhos de desespero, como se me perguntasse: “porque você não me tira daqui???” E a gente tem mesmo que buscar forças nem sei de onde, contar com toda a nossa rede de apoio, e aprender, aprender sempre com a nova situação… Mas ah, como é duro aprender que a gente não pode tudo, que a gente faz o melhor por eles e mesmo assim continuamos vulneráveis à certas coisas… Como é duro não poder garantir proteção 100% à eles… Como a gente fica frágil… e ao mesmo tempo, como a gente se descobre tão forte??? No nosso internamento, eu não consegui comer nada, dormi pouco e mal, e assim como você, guerreava a cada minuto contra os maus pensamentos. Mas também fui firme para conviver e aceitar o que precisava ser feito, para questionar e desautorizar o que não concordava e, consequentemente, bancar minhas decisões…
    Me solidarizo com a sua experiência, admiro as suas colocações, e mesmo não tendo convivência com vocês, vibrei as melhores e mais amorosas energias para Filipe, você e sua família. Ler o seu post me fez reviver os meus dias difíceis, mas também me fez sentir um alívio gostoso, imaginando essa alegria de vocês em voltar pra casa. 🙂

    Um beijo grande e cheio de carinho!

    Milena Aguiar

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    • Oi Milena, obrigada por compartilhar e por ter torcido por nós. Sinto que a parte mais difícil da maternidade é justamente essa: aceitar que não os pouparemos das dores, mas que estaremos ali do lado.
      Agora é curtir a saúde e a vitalidade dos pequenos. Bjos

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  2. Convivemos com Filipe desde seu nascimento, uma contínua festa repleta de alegrias. Vê-lo todo espetado de agulhas nestes últimos dias foi bem difícil, mas observar como ele reage às situações contrárias foi um grande ensinamento para nós e agora vê-lo retornar à casa recuperado é muito bom.

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  3. Eu não sei descrever o que Filipe é pra mim. Ele é neto, é um filho adotivo, é realização de um grande sonho, é renovação de minha vida, ele é minha alegria ! Vê-lo doente e sofrendo me fez experimentar a pior dor na minha alma ! Também não sei dizer em palavras como dói. Os pensamentos horríveis insistiam em me torturar e o medo de ter de consolar minha filha me rasgava a alma. Foi muito difícil passar este vale mas Graças a Deus que sempre nos conduz em triunfo estamos felizes e agradecidos a Deus pela sua fidelidade e a todos que intercederam e nos confortaram

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